Um caminho doce. Doce que não vem só do açúcar, mas que adoça a vida com afeto, carinho e amor. Doce que deixa a vida da gente – e delas – mais leve, mais afetuosa e mais alegre. Um caminho que nos transporta para um lugar de tradição, leva nossos pensamentos para a casa da avó no interior, da calda brilhante e do tacho de cobre que a gente esperava prá “rapar”.
Avental, lenço na cabeça e barriga esquentado a beira do fogão à lenha. Um papo gostoso, uma risada solta e o olhar atento à mistura para o doce não desandar. As frutas que ficam de molho prá tirar o amargo, os segredos do ponto certo, as combinações na sobremesa.
Um caminho da culinária herdada de Portugal para as grandes fazendas do Brasil e encontrou pouso na região da Lapinha em Lagoa Santa na primeira metade do século XX, quando a prática da produção artesanal de doces e quitandas foi repassada de geração em geração e era fonte de renda para as mulheres da região.
A partir dos anos 70, com a inauguração da Gruta da Lapinha, um dos belos atrativos do Circuito das Grutas, como atrativo turístico, as doceiras começaram a comercializar seus produtos no entorno da Gruta e essa atividade se tornou a principal fonte de renda de diversas famílias que viviam por ali. Com o passar dos anos houve um declínio dessa comercialização com a perda do espaço ao redor da Gruta e em 2018 foi então criada a ROTA DAS DOCEIRAS DA LAPINHA.
Conversei com Adélia Carmo, que já faz parte da terceira geração das doceiras que me conta que muitas doceiras tem mais de 80 anos e carregam consigo os segredos e toda a tradição do ofício da produção de doces e quitandas da região, tradição essa que envolve a transmissão dos saberes entre as diversas gerações ao longo do tempo, tendo essas mulheres, como principal fonte de propagação e perpetuação dessa memória.
Os agendamentos são feitos com a Marta Machado, a Matinha do Receptivo Turístico da Lapinha, que juntamente com a Adélia trabalha com as divulgações nas redes sociais. Junto com as demais doceiras elas se organizam para receber os turistas.“Já recebemos muitos grupos de turistas, gente de toda parte do Brasil e inclusive alguns estrangeiros. Todos vem conhecer a gastronomia e a cultura da nossa região.” conta.
Adélia representa a marca Dona Roxa que fabrica de geleias de abacaxi com pimenta e licores a incrivelmente saborosas ambrosias. O nome da marca veio em homenagem à mãe. “Antigamente, quando nascia uma criança negra, eles falavam: ‘nasceu uma criança roxinha’”, explica. Cada doceira traz consigo as receitas de família e com o passar dos anos a quantidade de açúcar utilizado foi diminuindo. Os maiores ingredientes são frutas, leite e saudade. “O ponto da cozinha artesanal é acessar a memória afetiva do cliente. Porque as pessoas, às vezes quando experimentam o doce de alguma das doceiras lembra: ‘nossa esse doce parece com o da minha avó, lembrei da minha mãe…’ lembra sempre de alguém importante que cozinhava na sua infância. Esse é o ponto do nosso doce.” explica.
Devido à quarentena, a Rota das Doceiras continua funcionando a todo vapor com a comercialização dos doces e quitandas. Porém as visitas estão suspensas nesse momento. Enquanto não é possível fazer a visita completa e presenciar toda essa alquimia de saberes e sabores, é possível entrar em contato com elas e encomendar os doces. (instagram abaixo)
COMO FUNCIONA A VISITAÇÃO
Você deve ligar para a Martinha (contato abaixo) para fazer o agendamento – não há limite de pessoas “pode ser um grupo maior ou com poucas pessoas também.” Ela entra em contato com as doceiras para marcar as casas que serão visitadas e uma oficina também pode ser agendada para acompanhar a produção de um determinado doce e nesse caso é acertado um valor. “Tudo é combinado”. A Martinha acompanha o grupo durante a visita. Também faz parte do passeio a visita à Gruta da Lapinha, à igreja de Fidalgo e à Casa Fernão Dias na Quinta do Sumidouro. Ainda pode ser agendado um Café da Manhã e um almoço.
Esse, com certeza, é daqueles programas que não podem faltar na lista “do que fazer quando tudo isso passar”. Circuitando por aí!, a menos de uma hora de Belo Horizonte, em Lagoa Santa, fazer a Rota das Doceiras da Lapinha é dos prazeres que a vida nos presenteia e não podemos nos fazer de rogados, tem que ir!
PATRIMÔNIO
Em 2017, o modo artesanal de fazer os doces e as quitandas da Lapinha foi registrado como Patrimônio Imaterial do Município, um instrumento legal de preservação definido pelo Conselho Municipal de Cultura e Patrimônio Histórico. O intuito é preservar as raízes culturais locais. A tradição surgiu com as fazendas coloniais da região, em especial a do Fidalgo. Os doces eram feitos com as frutas da temporada que eram abundantes na localidade, como figo, mamão, laranja da terra e limão. Havia opções em compotas e cristalizados, que eram servidos em festas, casamentos e batizados. A Lapinha já está em sua sexta geração de doceiras. Em 2018, o projeto da Rota das Doceiras surgiu para resgatar a tradição e convidar os visitantes a conhecerem a gastronomia local.
CONTATOS
Clique aqui e visualize a Rota no Google Maps
Receptivo Turístico da Lapinha: 031 3689-8422
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Por Narly Simões